A cidade como coadujante em um sketch de Carlos Hollanda |
Desde meu primeiro conto publicado, Eu matei Paolo Rossi (Outras Copas, Outros Mundos, 1998), onde o Rio divide o palco com Barcelona, que os morros, as praias e a área urbana carioca servem como pano de fundo – ou elemento ativo, como no caso de O dia em que Vesúvia descobriu o amor (Cidades Indizíveis, 2010)– para meus devaneios e tentativas literárias. Porque não me vejo como parte de outro lugar e acredito que devo algo ao local em que nasci.
Por isso, em diversas cenas de Psicopompo temos o contraste verticalizante dos morros do Rio como uma metáfora meio óbvia para os conflitos sociais que desde sempre sacudiram a cidade. Personagens caem, almejam o céu, avistam a orla, muitas vezes “pairam” sobre cenários em alturas impossíveis. Tudo para exagerar o senso de urgência, de “desnível”, que o Rio sempre me passou. Afinal, uma cidade entre o horizontal e o vertical, praias e morros, pode ser encarada como a materialização do senso de instabilidade. Nada é tranquilo no Rio, tudo é sempre um pouco desequilibrado.
Contracapa do CD Musical Guide From Stellium |
Esse contraste já estava presente em meus projetos desde os anos 90, quando produzi, em parceria com Gilberto Zavarezzi, uma capa para o disco Musical Guide From Stellium, da banda Dorsal Atlântica. A contracapa mostra o pão de Açúcar como se fosse visto através das ruínas de um templo, em um morro inexistente.
A mesma vista impossível, aparece, de certa maneira, em um dos quadros de Psicopompo (o mesmo mostrado no início deste post). É uma homenagem ao Rio de Janeiro, mas também é um jeito nada sutil de inserir a urbe, senão como protagonista da HQ, talvez como uma presença mais direta. Porque cidades também tem alma.
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